05 junho 2008

O amor perdido da Ines


Inês olhou-se ao espelho, alguns cabelinhos grisalhos... não se importava, até lhe davam um certo charme... A cabeleira continuava farta, tinha os cabelos meio longos, bastante encaracolados, castanhos com reflexos acobreados resultado, por um lado, da coloração feita há já alguns meses e, por outro, das idas frequentes à praia. Sempre gostara de ir à praia, desde criança era louca pelo mar. Nutria por ele uma atracção profunda, magnética, por vezes, até parecia sentir o chamamento do mar. Só ele a compreendia, a ouvia sem ela ter que falar, sentia seus sentimentos, percebia suas razões... Chega de divagar!

Abriu a gaveta e tirou um gancho com o qual prendeu os cabelos entretanto enrolados. Voltou para a sala silenciosa, instalou-se confortavelmente no seu sofá preferido e pegou no livro que tinha deslizado para baixo de uma das almofadas. Começou a ler, ou melhor, tentou... Não se conseguia concentrar. Ele não lhe saia do pensamento.

Reencontraram-se há meio ano, 22 anos depois de terem sido namorados. Seu 1º namorado... tinha então 17 anos... o 1º beijo, os caracóis dele, as mãos... Lembrava-se de tudo ao mais pequeno detalhe... Como era doce aquele namoro inocente. Não foram para além dos beijos, abraços e umas apalpadelas.

Lembrou-se daquele dia em que foram para um beco bem calminho, atrás da igreja. Beijaram-se... adorava os lábios carnudos dele. Ele estava meio ofegante, fez deslizar suas mãos para debaixo da blusa dela, ao encontro dos seios firmes... Ela estremeceu, nunca tinha sido tocada antes, as mãos dele despertaram nela sensações maravilhosas...Uma das mãos deslizou para o umbigo, um pouco mais abaixo… todo o corpo dela tremia, tudo isso era novo ... Desejavam-se... Até hoje não sabe bem como se contiveram mas pararam ali e não aconteceu mais nada. O medo de serem surpreendidos, o sonho de um momento mágico num local romantico e privado, e (só o soube passados todos estes anos) o medo que ele tinha do pai dela teriam sido as razões que os impediram de ir mais longe. Pouco tempo depois acabaram o namoro e cada um seguiu seu caminho, em direcções opostas.

Passados todos estes anos, reencontraram-se e rapidamente a amizade que os unia transformou-se em algo mais. Ela estava divorciada, também ele, mas tinha uma namorada, vivia com ela. Inês tinha recebido uma educação, em parte, conservadora. Havia valores incontornáveis, nunca se envolveria com um homem comprometido... Mas a verdade é que a atracção entre eles era demasiado forte, perdeu o controlo da situação. Havia entre eles uma química muito forte, um misto de saudades do passado perdido no tempo e vontade de o retomar no presente. Tornaram-se amantes. Ela amava-o, amava-o de uma forma que não conseguia explicar. Mas, explicar para quê? O amor não precisava de explicações. No entanto, tinha remorsos, sentia-se culpada por ter um relacionamento com alguém que estava comprometido com outra pessoa. Pensou que ele a amava também. Embora nunca lhe tivesse prometido nada e nem lhe tenha escondido o facto de ter uma namorada, sentia-se traído por ele. No fundo, alimentou uma esperança de que ele ficasse com ela,... só com ela! Mas enganou-se. Mesmo tentando não ver, fingindo não se aperceber, foi obrigada a reconhecer que as coisas não estavam bem, aliás, estavam muito mal. Sentiu-se usada, enganada, desrespeitada também. Ele mais não queria do que manter a namorada e a amante. Sim! Amante! Era nisso que ela se tinha transformado. Uma espécie de brinquedo para as horas vagas e que era atirado para um canto quando outros deveres se impunham. Que situação horrível! O pior é que ainda assim, durante algum tempo, sujeitou-se a fazer essa triste figura. Amava-o e agarrava em qualquer oportunidade para estar perto dele, ainda que apenas por alguns minutos. Mas não podia ser! Tinha que colocar sua vida nos trilhos de novo. Por que razão alimentaria uma relação clandestina e que destruiria seu bom nome e reputação se se soubesse. Pensou no desgosto que seus pais teriam; a vergonha dos filhos... e isso deu-lhe força para decidir. Acabou! Não iria mais continuar nessa relação condenada. O amor que sentia, a química entre eles, nada justificava continuar nessa relação injusta e desgastante. Doía-lhe imenso.

Durante o fim-de-semana os filhos tinham estado fora. Dormiram em casa do pai na Sexta e Sábado foram para casa dos tios para o aniversário da prima. Dormiram lá e só voltaram Domingo à noite. Ele soube disso e quis ir à casa dela. Mas ela resistiu! Como queria recebê-lo, estar com ele... Mas não podia fazê-lo. Mais uma vez, ele a usaria para depois partir rumo ao lar e à namorada com quem dormiria à noite. Recusou. Seus olhos ficaram cheios de lágrimas mas conteve-se. Não choraria mais por esse amor de adolescência. Ia cuidar de si. Ia dar um novo rumo à sua vida. Foi com esse pensamento que acabou por adormecer no sofá. Horas mais tarde acordou com o pescoço dorido mas um sentimento de alívio. Tudo acabaria bem! Não lhe faltariam forças para tomar em mãos seu destino e dar-lhe outro rumo. Levantou-se e foi para o quarto dormir.

2 comentários:

Paulino Dias disse...

Ola, Black Cherry!

Nao sei porque raio so agora decubro este teu cantinho. Alias, delicioso cantinho! Adorei a forma como escreves, tao simples e intimista que eh impossivel nao nos tocar.

Se me permitires, vou fazer daqui tambem o meu cantinho de visitas...

Abracos,
Paulino

Black Cherry disse...

cOlá Paulino,
Obrigada pelas simpáticas palavras. De quando em vez vou espreitar o teu blog também onde leio as aventuras das caminhadas e fico sempre encantada com as fotos do nosso lindo interior. Espero ver-te por aqui mais vezes. A porta está sempre aberta :D